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Economia da atenção

Estratégias de inovação e criatividade



Uma tela pintada retrata um acidente automobilístico. Talvez seja uma imagem para não se esquecer - corpo caído e retorcido para fora de uma ambulância. Ele poderia ter saído de mentes criativas de agências de propaganda para campanhas sobre acidentes por excesso de velocidade. No entanto, fora elaborado por volta de 1960 pelo artista Andy Warhol. Essa cena infeliz do cotidiano recebeu um célebre endosso: "um dia, todos terão direito a 15 minutos de fama". O tempo trouxe muita verdade sobre essa previsão, ainda que ela tenha ocorrido de maneira um pouco diferente.


São muitas informações disponíveis e telas presentes disputando atenção no cotidiano das pessoas (Krum, 2010). O sentido de concorrência mudou bastante, parecia ser mais fácil quando o desafio era essencialmente engajar e vender mais que o concorrente. Por isso, estabelece-se o que Wolton (1996) chama de sintonia entre interlocutores como algo comum e desafiador. Para tanto, é preciso esmiuçar o sentido da atenção em meios repletos de informações e de recursos midiáticos tecnológicos, sua intercorrência com a formulação de histórias narrativas de marcas e de pessoas. Vale apreciá-la como uma tela em exposição que aguarda uma galeria para ser apresentada. Ademais, o elemento nuclear “atenção” é definido por Houaiss e Villar (2009) como concentração da atividade mental sobre um objeto determinado, reunidos em três pares de opostos: aversão/ atração, obrigatória/ voluntária, direta/ indireta. A grande importância dessa condição mental está no seu sentido de pré-requisito a cerca de determinada ação, seja de: expor, comprar, endossar, compartilhar, assistir, selecionar, interagir ou votar.


De acordo com o modelo A.I.D.A. a atenção se configura como a primeira etapa do processo de estímulo ao consumo, sendo o ponto de partida de qualquer ação consequente. Em outras palavras, ela é o cerne ou core dos negócios, bem como de suas narrativas (especialmente no advertainment – Santa Helena e Pinheiro, 2012). É ainda mais importante quando se reconhece sua finitude e escassez em um ambiente de ampla concorrência, daí deriva o conceito da “economia da atenção”, conforme Davenport e Beck (2001). Quem não tem, quer tê-la; já aqueles que têm, anseiam por mais, conforme Alder e Firestone (2002). Tal efeito se dá para Simon (2019), pois a informação consome atenção dos seus destinatários. Sendo assim, este desafio contemporâneo surge para gerentes de marcas, influenciadores digitais, publicitários, músicos, roteiristas, cineastas e criativos em geral.


O excesso de informação dialoga diretamente com o aumento exponencial de opções de produtos, serviços e conteúdos, tal como Kotler (2017) e Longo (2018) apresentaram. Na busca pela conquista do “olhar” chega-se ao entendimento de uma realidade centrada na hipercomunicação. Nela os diferenciais de marcas podem não durar tanto, sendo efêmeros e fugazes, tais quais os relacionamentos humanos (Bauman, 2001).


Em sequência, para Martinuzzo (2014), na atualidade o aumento de informações não parece desacelerar, segue em crescimento. Como a quantidade de atenção humana é limitada, Davenport e Beck (2001) sugerem: promover comunicação dinâmica e passível de personalização; contar histórias cativantes de personagens reais; fomentar interação dialógica e multimídia; tratar de valores caros à sociedade e deixar um “cliffhanger” nas mensagens. Já Alder e Firestone (2002) também apontam o caminho de uma interlocução feita sob medida, celebrando um produto de comunicação que congregue tanto mensagens dos anunciantes como informações desejadas pelos consumidores.


Como uma nova ferramenta de comunicação, o sentido de storytelling pode conotar de maneira polissêmica. De início, para Xavier (2015), é a tecnoarte de elaborar e encadear cenas, dando-lhes um sentido envolvente que capte a atenção das pessoas e enseje a assimilação de uma ideia central. Antonio Núñez, em seu livro “¡Será mejor que lo cuentes!”, acrescenta que: “ao expor um conflito, revela uma verdade que aporta sentido a nossas vidas”. Assim sendo, toda uma dimensão humana emerge para se vincular com os espectadores. Tal qual as histórias ficcionais espalhadas como são na realidade, não têm finalidade maior do que transportar significado. Erza Pound (poeta e crítico literário americano) define o contexto da contação como “linguagem impregnada de significado no maior grau possível”. Decerto, marcas são entidades ficcionais exploradas na maioria das vezes por pessoas jurídicas, sendo arquétipos que habitam o mundo real e esbarram conosco o tempo todo. Xavier (2015) acrescenta que muitas marcas correm para organizar suas histórias, redimensionar seu valor intrínseco e adquirir novos significados com maior relevância nas narrativas de seus usuários – tudo isso para terem sentido para alguém.


De acordo com Martinuzzo (2014), com as práticas socioeconômicas e político-culturais articulando-se ao universo midiático, ele se torna o lugar privilegiado da existência. Um exemplo interessante dessa nova linha editorial provém de casos como da marca Matrix. Em linhas gerais, segundo Kinder (1991) e Martino (2015) uma narrativa transmídia é uma história que se desdobra em várias plataformas e formatos, cada uma delas trabalhando em sua própria linguagem e acrescentando elementos novos ao conjunto da história. Já Jenkins (2003) formulou a definição de transmídia storytelling, donde o ponto de convergência e transmutação de conteúdos é a mente humana, muito por conta de versões, de transmissões e de releituras criadas pelo fandom.


O Bing é um caso interessante de transmídia e storytelling com marcas. Em vez de lançar o Bing, a Microsoft lançou o livro do Jay-Z com exclusividade em seu buscador. Cada página foi colocada em diferentes cidades, sempre em locais que constavam na narrativa. O editorial ainda não havia sido lançado, mas já podia ser lido por aqueles que participassem do jogo. Desse modo, por meio da simbiose de marcas presentes na ação se deu um efeito Interbrand Storytelling.


O sentido criativo relativo com o storytelling pode se aproximar de narrativas inter-relacionadas com máquinas e tempo. Atualmente, existem games que simulam o sentido cronológico real, evitando a interrupção da narrativa. Tal prerrogativa se justifica, pois o título Returnal se aproxima de um sonho. Então, ao sair do jogo ou desligar o console é como acordar – daí o game recomeça da primeira fase. O salvamento só é habilitado durante o uso da função “sleep” do PS5. Experiência muito bem projetada em termos de significado simbólico, mensagem e função.


Tal como o game, surgem tendências importantes: histórias de marcas com posicionamento de causa e os storydoers. Tais vertentes dialogam com o storytelling que entretém, anima, emociona e engaja, tudo em conjunto com temas sociais. Nesses casos, a ação é mais do que um exercício de protagonismo, é uma forma de narrativa e de estética vivencial.


Ainda é cedo para saber o tamanho das consequências da COVID-19 para a indústria da comunicação e do entretenimento, mas dá para traçar um paralelo entre a greve dos roteiristas nos Estados Unidos, nos anos 2007 e 2008, com o contexto atual. Pela primeira vez na história da televisão brasileira, se tem a Globo interrompendo suas gravações de novelas e de séries. Enquanto isso, o Globo Play muda sua dinâmica de lançamento de produtos, se antecipando aos canais abertos e pagos, seguindo caminhos próximo de players como o Netflix. Outrossim, a pandemia teve efeitos catastróficos para o cinema nacional e o desmonte das políticas de estímulo lança dúvidas sobre a recuperação do setor. 

Por fim, os próximos anos serão de recuperação, reformulação e reestruturação para a indústria do entretenimento e da comunicação como um todo. Melhor aguardar às cenas dos próximos capítulos ou às próximas telas que serão pintadas.



Referencial teórico


DAVENPORT, T. H.; BECK, J. C. Economia da Atenção. Rio de Janeiro: Editora Elsevier: 2001. 304 pg.


KOTLER, P. Marketing 4.0. Do tradicional ao digital. Rio de Janeiro: Editora Sextante, 2017. 208p.


LONGO, W. Marketing e Comunicação na Era Pós-Digital (pp. 14-15). Alta Books. Edição do Kindle.


MARTINO, L. M. S. Teoria das mídias digitais. Editora Vozes. Edição do Kindle, 2015.

SANTA HELENA, R.; PINHEIRO, A. J. A. Muito além do Merchan! Como enfrentar o desafio de envolver as novas gerações de consumidores. Rio de Janeiro: Ed. Elsevier, 2012. 292p.


SIMON, H. A. The sciences of the artificial (Third edition). Cambridge: MIT Press, 2019. Kindle edition.


XAVIER, Adilson. Storytelling: histórias que deixam marcas. 9. 3ed. Rio de Janeiro: Best Business, 2015. 302p.


WOLTON, Dominique. Elogio do grande público: uma teoria crítica da televisão. Tradução de José Rubens Siqueira. São Paulo: Ática, 1996.

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