As mudanças no ecossistema do mercado publicitário e os desafios criativos
O sentido de ecossistema remete ao de um bioma ou dos planetas girando em torno do Sol, onde o todo e suas parte se relacionam. Como toda construção em curso, ainda em constante dinâmica, permitir um distanciamento para análise é uma boa prática da ciência. Para tanto, no texto dissertativo os autores selecionados darão conta dessas funções.
Por meio da dissertação de Rendeiro (2018) será lançada luz para alguns eventos importantes na história da comunicação no Brasil. Em 1808, deu-se o surgimento do jornal Gazeta do Rio de Janeiro, com espaços para os primeiros classificados. Já em 1900, nasceram as primeiras revistas com páginas coloridas: “Da Semana”, “O Malho” e “Fon-Fon!”. Já em 1914 foi lançada a agência Eclética (SP) primeira empresa que negociava espaços publicitários. Um marco importante ocorreu em 1926, após se instalar no Brasil a General Motors (GM) com sua house. No ano de 1927, teve início a primeira estação de rádio nacional, a Rádio Educadora do Rio de Janeiro.
Em 1942, se dá um fato importante com o início do IBOPE. Já em 1949, no pós-guerra, foi criada a ABAP. Em 1950, aconteceram o Salão Nacional da Propaganda, no Masp, e a primeira transmissão nacional pela TV Tupi (SP). Em 1960, Assis Chateaubriand criava o jornal Correio Braziliense e a TV Brasília.
Em 1967, o sentido da liberdade se apequenou com a Lei nº 5.250. Naquele 1968, foram inauguradas a Rede Globo de Televisão e a revista Veja. Um “segundo tiro na democracia se escutou” com o AI-5, em 13 de dezembro de 1968. Em 1978, realizou-se o III Congresso Brasileiro de Propaganda, que aprovou o Código de Autorregulamentação Publicitária. Exatamente em 1980, se dava à Fundação do CONAR. Em 1989, a TV por assinatura era introduzida oficialmente no país. O ano seguinte apresentava o começo da internet no Brasil e o mundo da comunicação nunca mais seria o mesmo.
Em 1995, o UOL e a agência Click marcavam seus inícios. Em 2003, com o lançamento do Myspace, o ciberespaço ganharia um sentido diferente. Em 2004, surgiam o Orkut e o Facebook. Nos anos de 2005 e 2006, respectivamente o You Tube e o Twitter abriam suas URLs. No ano de 2008 é inaugurada, nos EUA, a IBM IX uma consultoria de negócios que se tornaria modelo para os maiores concorrentes das agências de publicidade convencionais. Em 2013, durante o evento “Copa das Confederações”, o filme da Fiat com trilha do Rappa levava uma massa de descontentes para rua. Perto do presente, em 2018, entrava em vigor o Regulamento Geral de Proteção de Dados (GDPR) e Mark Zuckerberg foi chamado para depor sobre o escândalo do Facebook.
É importante destacar que ao longo da história, em vários momentos, os governos tentaram controlar as atividades das agências e do mercado de comunicação. Seja na instauração da ditadura ou, de maneira recente, cerceando questões de representação de raça e de gênero na campanha do Banco do Brasil.
No sentido histórico o campo concede lastro, dignificando como os publicitários colaboraram na formação da identidade nacional. Talvez anos de sucesso tenham tornado fixa uma estrutura que deveria ser maleável. Ainda que novos nomes tenham aparecido (RTVCi e Creative Technologist), muito da essência dos primórdios ainda reside. Não parece estranho considerar, que muitas soluções tenham algum grau de semelhança com os tempos antigos. Outra questão importante para se entender o ecossistema atual, diz respeito com o aspecto geracional conflituoso de sua composição. Nomes da época dourada, com verbas suntuosas e atitudes de rock star, vindos de um sistema de mídia unidirecional e unicista parecem não compreender os recém-chegados; promovendo poucos espaços de fala. Enquanto eles, os mais jovens, advindos da transformação digital, resistem em escutar os mais experientes.
Em adição, surgindo como um contraponto ao tópico da criação como commodities, outros métodos foram introjetados, aproximando o meio do Design Thinking e do pensamento ágil. Muito desse movimento de resgate surgiu como uma resposta aos escritórios de Design que assumiram funções de veiculação.
Diante de um cenário tão desafiador para a publicidade, entender o comportamento migratório dos consumidores vira pauta principal. Não existe mais fronteira entre o digital e o ordinário (Lévy, 2010), entre on-line e off-line. Assim sendo, Longo (2018) defende que toda marca deve ser hub de conteúdo, já Martinuzzo (2020) preconiza o desenvolvimento de mídias tailor made e, por sua vez, Rowles (2019), no termo Digital Branding, enfatiza o controle em todos os pontos de contato com o consumidor.
Para além do que fora apresentado, cabe entender como o campo da publicidade e da propaganda, que prima por renovação, compreende os dois pressupostos responsáveis pela fotografia atual: fragmentação da audiência e dispersão da atenção (Santa Helena e Pinheiro, 2012). Como resposta, o poder do entretenimento como mídia serve para alargar a área, promovendo interesse e desejo através do advertainment. O impacto dos “hubs de conteúdos” deveria ir além dos setores de criação, passando para dentro das empresas e das comunidades – como o Digital Favela faz, formando novos influenciadores digitais diferentes do estereótipo do jovem branco de classe média (Rowles,2021; Longo, 2019).
Conforme Longo (2019), muitas marcas estão se vendo como publishers, buscando mais relevância em tempos de atenção fragmentada e Big Data. Afinal, de acordo com Jenkins (2014), aquilo que não se propaga, morre. Essa simples máxima parece definitiva quanto ao ciclo de recombinação de bits na mente humana. Desse modo, parece existir uma mudança de paradigma na mídia: a passagem de uma mentalidade regulada pela lógica da radiodifusão, própria do século XX, para outra em que o controle sobre a produção e a distribuição passa aos consumidores – sem grade de programação fixa ou horário nobre.
Para Longo (2018) a tecnologia digital foi absorvida e faz parte de todos os aspectos da vida durante o tempo todo. Desse modo, caminhar entre veículos não é mais uma competência exclusiva dos profissionais de publicidade e de propaganda, tanto influenciadores como audiência já fazem isso. O sentido “media” faz parte do way of life diário da população instruída e conectada.
Navegar e comprar on-line são verbos da moda em 2020 e 2021, sendo prevalentes em 87% das famílias brasileiras. Aqueles que aperfeiçoaram suas ferramentas de publicidade on-line podem prosperar com estratégias de OTT e de remarketing, em que se aproveita muito do histórico de navegação do consumidor. Dessas novas inter-relações com os públicos pode-se observar o surgimento de outros veículos na contemporaneidade: narrativas de suporte para marcas, plataformas de entretenimento, games, aplicativos, filmes com tie-in, cross promotion, brand editorials, celebridades como marcas, flash mobs,brand placement em clipes musicais e eventos transmídia (Santa Helena e Pinheiro, 2012).
Por fim, apesar dos últimos anos terem criado muitas barreiras para todo o ecossistema do mercado criativo, um alento pode vir da capacidade humana de sonhar, de inovar e de criar.Ainda mais, com o aumento das pessoas vacinadas no horizonte, o futuro certamente parece melhor ou, ao menos, não tão recluso.
Referencial teórico
ADOLPHO, C. 8Ps do marketing digital: O guia estratégico do marketing digital. 3aed. São Paulo: Ed. Novatec, 2010. 891p.
GABRIEL, M.; KISO, R. Marketing na era digital (p. 521). Atlas. Edição do Kindle.
KOTLER, P. Marketing 4.0. Do tradicional ao digital. Rio de Janeiro: Editora Sextante, 2017. 208p.
LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 2010. 272p.
LONGO, W. Marketing e Comunicação na Era Pós-Digital (pp. 14-15). Alta Books. Edição do Kindle.
RENDEIRO, F. F. Mercado publicitário: transformações na contemporaneidade. Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Gestão da Economia Criativa pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM. Rio de Janeiro, 2018.
ROWLES, D. Digital Branding: Estratégias, táticas e ferramentas para impulsionar o seu negócio na era digital. 1a ed. São Paulo: Autêntica Business, 2021. 281p.
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